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Religião, um Círculo tedioso de Debate

Texto de Walter A. Bach, encontrado em http://ubdeistas.blogspot.com.br/2013/05/religiao-circulo-tedioso-de-debate.html

Roda de conversa, você e mais alguns amigos ou familiares. O café está ótimo, todos estão rindo, seja de algum incidente do cotidiano ou de alguma piada ouvida no corredor do trabalho. A conversa vai por vários tópicos, até que alguém, nada discretamente, começa a falar de religião. Porque isso e aquilo, sabemos disso, está provado em tal lugar, foi escrito anos atrás, o ser humano mais aquilo e nada… para quem já se sentiu farto desse tipo de situação, essa é a hora em que o café desce pela garganta com um gosto mais amargo que o normal.

“É importante incentivar a pessoa a participar da vida na igreja”, “ele está sempre estudando o tema”, “ele que era tão devoto de tal crença e agora está nessa outra igreja”, com o devido respeito, irei parar de reproduzir pérolas (manchadas) aqui. Todos já ouvimos pelo menos uma, e, redundantemente, iremos ouvir mais.

E nada que seja absolutamente novo. Não apenas pela repetição de pseudo máximas que dependendo de quem as fala e do tom de voz soam terrivelmente maniqueístas, mas porque nessas horas, salvo raríssimas exceções, conversar sobre religião se torna algo tedioso.

Ainda que o passado brasileiro tenha sido quase monopolizado pelo catolicismo, a suposta pluralidade religiosa significa que temos diferentes formas de nos aborrecer com o tema. O singelo fato de um sem número de batizados desta religião a terem abandonado (não entremos em tais detalhes) já é uma amostra de quantos órfãos ela consegue deixar. A despeito disso, a ‘religião oficial’ do país ainda possui numerosos fiéis, capazes de buscar o santo adequado a sua situação como quem procura peças em uma loja de mecânica.

Tedioso também porque a crescente massa de evangélicos está criando estereótipos cada vez piores. Frequentadores de instituições com regras arbitrárias (já ouvimos aquelas de ‘não pode assistir televisão’ ou instruções de vestimenta) ; pessoas que buscam igrejas adeptas da dita teoria da prosperidade, predominantemente material; ramificações infindáveis em meio a um povo que apesar de ter o mesmo ‘título’ – evangélico – parece não haver acordo em quem tem mais razão que o outro em seguir a bíblia; espetacularização do aspecto religioso, com transmissões televisivas dignas de uma produção cinematográfica comercial; poderíamos citar muitas outras razões pelas quais os evangélicos muitas vezes , sem perceber, vulgarizam a si mesmos com tamanha expressividade.

Chato de discutir porque independente do indivíduo seguir uma doutrina católica, evangélica ou qualquer outra, o efeito mais conhecido é de que ele fique com uma viseira acima dos olhos, impedindo-o de aceitar outras religiões. Não precisamos nos esforçar para topar com quem manifeste preocupação em saber se uma terceira pessoa vai para o céu ou inferno por ser supostamente boa ou má, sendo que isso nem sequer é da nossa conta.

Há ocasiões em que acaba sendo cansativo até quando topamos com quem se diz ateu. Não pela descrença, nem pelos seus motivos. Mas os ataques de alguns contra as crenças vigentes enjoam. São quase sempre os mesmo argumentos- a religião engana, age como quem ignora o conhecimento, Deus não está preocupado com esse mundo e deixa a humanidade se quebrar sozinha, condiciona os indivíduos a pensarem sempre de um jeito, muito do que se ensina nas igrejas pode ser ou já foi feito melhor pela ciência, para citar alguns. Ninguém precisa se declarar ateu para perceber a aplicação de um ou mais desses itens – já deixou de ser surpresa encontrar uma pessoa batizada em uma religião e não praticá-la. Mas há ateus que preferem a pura verborragia anti-cristã do que se dedicarem ao estudo de algum assunto que lhes interesse, e quando se tem o desprazer de topar com alguém assim, é difícil medir o aborrecimento causado por eles ou por fanáticos.

Há ainda a malfadada situação: questionado se segue uma religião, você responde que nenhuma, e é taxado de ateu, como se qualquer um que não queira pertencer a uma organização religiosa tradicional o fosse. Quando o indivíduo prefere seguir uma filosofia, ou tem uma crença que não se encaixa nesse ‘padrões’, manifestando-a abertamente ou não, e é taxado de herege, ateu e rótulos semelhantes, é fácil ter a impressão de que a tolerância religiosa deste país é uma mentira.

O leitor ou leitora talvez me considere radical por tal afirmação. Talvez seja. Mas é no mínimo curiosa essa resistência de muitos adeptos de religiões tradicionais em aceitar particularidades fora de sua esfera, como se todo mundo tivesse obrigação não apenas de seguir alguma doutrina, mas principalmente de expressá-la e (pior) convencer outrem a acreditar nela.

É possível acumular conhecimento sobre diversas religiões, mas não é garantia de unir praticantes delas a entrarem em consenso. Mas mantém-se o círculo tedioso de debate sobre religião, cujas ‘conclusões’ ficam restritas a grupos de amigos, familiares e colegas, divididos por suas fés. O assunto é gasto rapidamente, os argumentos de sempre empilhados como tijolos na área de construção. Porém, não somente a pilha é disforme, como dificilmente se percebe que o solo onde ela está é menos sólido do que aparenta.

Texto de Walter A. Bach, encontrado em http://ubdeistas.blogspot.com.br/2013/05/religiao-circulo-tedioso-de-debate.html